Demissão humanizada: uma transição respeitosa e empática é possível?

A maioria dos trabalhadores já precisou lidar – ou ainda irá lidar – com alguma demissão em sua carreira. Independente do quão maduro e experiente a pessoa seja, essas situações sempre cobram seu preço na paz, planos e autoestima do colaborador desligado. Do lado dos gestores, dar a notícia também não é fácil, podendo gerar sentimento de culpa pela possibilidade de prejudicar a vida de alguém.

Ao longo dos anos, diversas organizações passaram a buscar novas formas de gerir e integrar equipes, no intuito de tornar o ambiente profissional mais aberto, inclusivo e saudável. Conceitos como a demissão humanizada foram pensados ainda no século passado, nos Estados Unidos, e gradativamente adotados em outros países.

Nos últimos anos, o conceito tem ganhado cada vez mais destaque nos debates sobre o mundo corporativo no Brasil. A crescente busca por ambientes de trabalho mais humanos e empáticos tem impulsionado empresas a repensarem a forma como conduzem o processo de desligamento de funcionários. Originado da necessidade de suavizar as tensões e impactos emocionais inerentes a uma demissão, essa postura visa oferecer um suporte abrangente durante a transição de carreira.

Ao mesmo tempo, no ambiente digital, a demissão humanizada tem sido contestada por parte das pessoas, como um conceito que se contradiz. Mas, afinal, ela é mesmo possível?

O boom da demissão humanizada na era do trabalho digital

A demissão humanizada surge em um contexto de transformações profundas nas relações de trabalho. O padrão tradicional da relação empregador-empregado tem evoluído para um enfoque mais equilibrado e consciente, em que se reconhece que a jornada de um colaborador na empresa não se resume apenas à sua atuação, mas também ao seu desenvolvimento pessoal e profissional.

Em contrapartida, as transformações constantes e intrínsecas no mercado acabam criando realidades não previstas em lei. Esses modelos criam relações em que trabalhadores são expostos a vínculos precários, além dos milhões de brasileiros com subempregos ou empregos sem carteira assinada, muitas vezes ignorados pelas instituições responsáveis pelo seu bem-estar.

Demissão nunca é fácil

Apesar das intenções positivas, críticos da demissão humanizada argumentam que ela pode ser vista como uma forma de mascarar o impacto real da perda do emprego. Alguns afirmam que, independente dos métodos utilizados, a demissão continuará sendo uma experiência negativa e angustiante. Além disso, há a preocupação de que uma abordagem excessivamente atenciosa possa criar expectativas irreais nos colaboradores, tornando ainda mais difícil a aceitação da demissão.

A distância entre a boa intenção e a falta de bom senso pode ser menor do que se imagina, e gestores podem criar situações constrangedoras mesmo que possuam empatia genuína.

Demissão humanizada não pode se tratar de presentes de despedida ou sobre comunicar o desligamento o tratando como algo casual e leve. Disfarçar a dificuldade da ação pode ser mais desrespeitoso do que se imagina, estendendo o processo de forma incômoda e traumática.

Mas o que é demissão humanizada? Ela é mesmo possível?

Sim, a demissão humanizada é possível. Mas talvez a tradução do conceito de outplacement process (em inglês) não tenha sido uma boa escolha, gerando discussões e fazendo com que outras nomenclaturas estejam começando a ser utilizadas, como ‘Demissão Saudável’.

Em resumo, a demissão humanizada é teoricamente uma abordagem que visa atenuar o impacto negativo da demissão tanto para a empresa quanto para o colaborador. Ela se baseia na empatia, na transparência e no respeito mútuo. Se trata de tornar o momento o menos traumático possível para a pessoa, sem deixar de considerar o quão difícil e decepcionante pode ser.

Além disso, uma demissão de fato humanizada estende esse apoio para além da conversa de desligamento apenas, oferecendo suporte para lidar com o momento e preparando o profissional previamente.

Como uma demissão empática pode ser feita?

Realizar um processo de demissão humanizada requer uma abordagem sensível e estratégica. Aqui estão algumas práticas e passos que uma empresa pode adotar para conduzir esse processo:

Preparação e planejamento: Antes de realizar a demissão, é crucial que a empresa esteja bem preparada. Isso envolve revisar a situação do funcionário, os motivos para tal e considerar todas as opções possíveis. Ter um plano claro ajuda a garantir que o processo seja conduzido com profissionalismo e cuidado.

Comunicação clara e direta: Ao comunicar a demissão, a empresa deve ser direta e honesta, explicando os motivos de forma objetiva. Isso evita ambiguidades e permite que o funcionário compreenda claramente a situação. A linguagem utilizada deve ser sensível, evitando termos que possam aumentar o impacto emocional. Também é fundamental que os responsáveis planejem previamente o que será dito, reduzindo o espaço para improviso.

Ambiente privado e confortável: O momento da demissão deve ocorrer em um ambiente privado, preferencialmente presencial, onde o funcionário possa expressar suas emoções e fazer perguntas, sem constrangimentos. Esse ambiente também ajuda a manter a dignidade do colaborador, evitando exposições desnecessárias.

Ouvir e respeitar emoções: Durante a conversa de demissão, é importante permitir que o funcionário expresse suas emoções, seja raiva, tristeza ou frustração. O gestor deve ouvir atentamente, demonstrar empatia e validar essas emoções, mostrando que o lado humano está sendo reconhecido.

Oferecer suporte e recursos: A demissão humanizada envolve fornecer suporte ao funcionário, se for possível, ajudando-o a lidar com a transição. Isso pode incluir serviços de aconselhamento, auxílio para atualização de currículo, orientação para busca de emprego e se disponibilizar a escrever cartas de recomendação. Existem empresas que até mesmo estendem a duração do plano de saúde ou colaboram com a formação do ex-empregado.

Opções de transição: Explorar opções de transição também é importante. Algumas empresas oferecem a possibilidade de realocação em outras áreas da organização, caso seja viável. Isso pode aliviar o impacto da perda do emprego e mostrar que a empresa valoriza as habilidades do colaborador.

Avaliação: Após a demissão, é valioso ter um momento com o ex-colaborador para entender suas percepções.. Isso demonstra interesse genuíno pelo bem-estar dele e oferece uma oportunidade para fornecer mais orientações ou apoio, se necessário.

Aprendizado: Após cada demissão humanizada, a empresa deve avaliar como o processo foi conduzido e identificar áreas de melhoria. Isso permite que a empresa aprimore suas práticas de demissão no futuro.

É importante ressaltar que o processo de demissão humanizada começa antes da decisão ser tomada. É fundamental que as empresas forneçam feedbacks honestos, educados e práticos para que os colaboradores tenham ciência de sua situação e saibam como se preparar e evoluir.

Caminhando para uma Relação de Trabalho mais Humana

A demissão humanizada é um reflexo da busca contínua por um ambiente de trabalho mais compassivo e equitativo. À medida que empresas e colaboradores se esforçam para construir relações baseadas em empatia, respeito e compreensão, processos assim surgem como tentativas de tornar momentos difíceis menos dolorosos. Ainda que desafios e críticas persistam, a consciência sobre a importância de uma abordagem empática na demissão vem crescendo e o empoderamento criado pela internet faz com que a classe trabalhadora seja cada vez mais vocal em relação a seus interesses e prioridades.

Compartilhe este artigo